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(Lucas 9:23-24)
Nos dias de hoje, a Igreja enfrenta todo tipo de batalhas: avareza, imoralidade sexual, uma taxa de divórcios que só vem crescendo, o vício das drogas e um apego cada vez maior às coisas deste mundo. Em pleno século XXI, o Cristianismo, em muitos casos, se transformou em um mero produto comercial, sem convicções cristãs, sem sacrifício pessoal e sem obras acompanhadas de fé, o que nos leva a termos uma sensação de que podemos, a qualquer momento, perder a guerra contra as atrações mundanas, pois elas fascinam os olhos e a mente dos filhos de Deus.Contudo, pode ser que as respostas para os nossos problemas não se encontrem no presente, mas no passado. Pois houve uma época em que os cristãos conseguiam afrontar o mundo, intimidando esse poder mundano, fazendo-o recuar diante de uma fé verdadeira, da obediência e confiança no Evangelho e da esperança na Eternidade.
A minha proposta nesta noite é mostrar como esses cristãos primitivos, do primeiro e do segundo século, viviam e combatiam essa filosofia mundana de sua época, que não era diferente da nossa cultura nos dias de hoje, e que está destruindo as nossas convicções cristãs por não serem combatidas com o conhecimento e obediência à Palavra de Deus. Portanto, aceitemos as palavras ditas por Jesus em Lucas 9:23-24: “Se alguém quer ser meu seguidor, que esqueça os seus próprios interesses, esteja pronto cada dia para morrer como eu vou morrer e me acompanhe. Pois quem põe os seus próprios interesses em primeiro lugar nunca terá a vida verdadeira; mas quem esquece a si mesmo por minha causa terá a vida verdadeira.” (Lucas 9:23-24 NTLH)
Ao refletir sobre todas as coisas que Jesus fez durante sua curta vida na terra, o apóstolo João disse que se elas fossem colocadas em papel “nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos” (João 21:25 NTLH). Ainda assim, na noite anterior à sua morte, Jesus teve que escolher dentre todos os seus ensinos e lições, alguns pontos-chave que Ele queria que seus discípulos se lembrassem para sempre. Ele poderia ter-lhes falado sobre teologia. Mas, não falou. Poderia ter-lhes repreendido por todos os erros que cometeram durante o tempo que passaram com Ele. Mas não repreendeu. Em vez disso, escolheu compartilhar com eles um estilo de vida que marcaria a história da humanidade: O surgimento da Igreja.
Jesus mostrou para os apóstolos que aqueles que fossem liderar a igreja deveriam servir aos outros, acima de tudo. Também lhes mostrou qual deveria ser a marca que distinguiria os membros fiéis da igreja. A seguir, veremos três marcas que Cristo destacou:
1. SEPARAÇÃO DO MUNDO:
“Se o mundo odeia vocês, lembrem que ele me odiou primeiro. Se vocês fossem do mundo, o mundo os amaria por vocês serem dele. Mas eu os escolhi entre as pessoas do mundo, e vocês não são mais dele. Por isso o mundo odeia vocês” (João 15:18-19 NTLH).
Um povo que não pertence a este mundo
Jesus disse aos seus discípulos que: “Um escravo não pode servir a dois donos ao mesmo tempo”. (Mateus 6:24 NTLH). No entanto, nos últimos dois milênios, nós, cristãos, temos tentado provar que Ele estava errado, pois queremos nos convencer de que podemos, sim, ter tanto as coisas de Deus quanto as coisas do mundo.
Muitos vivem de uma forma bem parecida com a vida daqueles que não são cristãos; a única diferença é que eles vão à igreja todas as semanas. Assistimos aos mesmos programas de televisão – que não nos edificam em nada e até nos corrompem moralmente –, gostamos de ouvir músicas que exortam a sexualidade e o adultério (e achamos normal), nos preocupamos com as mesmas coisas que um não cristão se preocupa, e até agimos movidos pelo egoísmo e pelo orgulho, semelhantemente às pessoas deste mundo. Ou seja, o “não pertencer a este mundo” existe mais na teoria do que na prática.
Contudo, a igreja não era assim nos primeiros séculos. Os cristãos primitivos viviam de acordo com os princípios e valores totalmente diferentes do restante da humanidade. Eles renunciavam aos privilégios, às imoralidades e aos divertimentos que o mundo oferecia, pois já eram cidadãos de outro reino e davam ouvidos à voz de outro Mestre. No primeiro século era assim, e no segundo a tradição continuou.
A obra de um autor desconhecido, escrita por volta do ano 130 d.C., descreve os cristãos para os romanos da seguinte maneira: “Vivem em seus próprios países como se fossem meros visitantes… São de carne, mas não vivem através da carne. Passam seus dias na terra, mas na verdade são cidadãos do Céu. Amam todos os seres humanos, no entanto, são constantemente perseguidos por eles. São pobres, mas tornam muitas pessoas ricas. Possuem quase nada, mas têm abundância de tudo. São humilhados, mas em sua humilhação, são exaltados… E aqueles que os odeiam são incapazes de explicar a razão de tanto ódio”. (autor desconhecido – Epístola a Diogneto)
Como a terra não era o seu lar, os cristãos podiam dizer como o Apóstolo Paulo: “Pois para mim viver é Cristo, e morrer é lucro”. (Filipenses 1:21 NTLH). A mesma temática está presente em todos os escritos dos cristãos primitivos. Da Europa à África, o assunto é sempre o mesmo: não podemos servir a Deus e ao mundo.
Para que não pensemos que os cristãos primitivos pregavam um estilo de vida que eles mesmos não conseguiam viver, os próprios romanos testemunham o contrário. Um pagão, antagonista dos cristãos, observou: “Eles não temem o sofrimento presente, mas têm medo dos sofrimentos incertos e futuros. Embora não tenham medo de morrer no prese
nte, têm medo de morrer na vida após a morte… Vocês (cristãos) não frequentam os eventos esportivos, não se interessam por diversões em público, rejeitam os banquetes do povo e abominam os jogos sagrados… (Felix, Marco M. Octavius)
Quando leio essas críticas que os romanos endereçaram aos cristãos, tenho a triste certeza de que hoje, dificilmente, alguém faria as mesmas acusações aos cristãos modernos. Não somos criticados por estarmos totalmente absortos com as coisas do Reino de Deus, a ponto de ignorarmos as coisas que o mundo oferece. Na verdade, os cristãos de hoje são acusados justamente do contrário: ser loucos por dinheiro e viver um cristianismo hipócrita.
2. AMOR SACRIFICIAL:
“Eu lhes dou este novo mandamento: amem uns aos outros. Assim como eu os amei, amem também uns aos outros. Se tiverem amor uns pelos outros, todos saberão que vocês são meus discípulos” (João 13: 34-35 NTLH).
Em nenhuma outra fase do Cristianismo o amor esteve tão presente quanto nos três primeiros séculos. A sociedade romana percebeu isso. Tertuliano, Líder da igreja de Cartago, África do Norte, informou que os romanos costumavam dizer: “Vejam como eles amam uns aos outros!” (Tertuliano. Apologia).
Justino Mártir, filósofo que se converteu ao Cristianismo, definiu o amor cristão da seguinte maneira: “Nós que valorizávamos a aquisição de riquezas e posses acima de tudo, agora entregamos o que temos para um fundo comum, que é dividido com qualquer um que necessite. Costumávamos odiar e destruir uns aos outros, recusando-nos a fazer associação com qualquer pessoa de outra raça ou nacionalidade, mas agora, por meio de Cristo, vivemos junto com essas pessoas e oramos por nossos inimigos”. (Justino – Primeira apologia)
O amor dos cristãos primitivos não era limitado aos seus irmãos na fé. Eles também ajudavam os que não eram cristãos: os pobres, os órfãos, os idosos, os enfermos, os abatidos e até seus perseguidores. Não é de admirar que o Cristianismo tenha se espalhado tão rápido pelo mundo antigo, mesmo havendo poucos programas evangelísticos organizados ou programas missionários. O amor que eles viviam chamava a atenção de todos, como Jesus disse que aconteceria.
3. CONFIANÇA EM DEUS:
“Jesus disse: Não fiquem aflitos. Creiam em Deus e creiam também em mim. A pessoa que aceita e obedece aos meus mandamentos prova que me ama. E a pessoa que me ama será amada pelo meu Pai, e eu também a amarei e lhe mostrarei quem sou”. (João 14:1; 21 NTLH)
João escreveu estas palavras no fim do primeiro século. Mas, a igreja continuou assim no século seguinte? Como foi a igreja do segundo século?
Confiando em Deus como crianças
Para os cristãos primitivos, confiar em Deus era mais do que um simples testemunho emocionado sobre “o dia em que decidi confiar no Senhor”. Significava acreditar que mesmo que obedecer a Deus causasse sofrimento, Ele lhes daria capacidade para superar os momentos difíceis.
Clemente declarou que “alguém que não faz o que Deus ordena, mostra que não acredita nele de verdade”. Para os cristãos primitivos, dizer que se ama a Deus e não obedecer-Lhe era uma grande contradição. Em 1 João 2:4: “Se alguém diz: “Eu o conheço”, mas não obedece aos seus mandamentos, é mentiroso, e não há verdade nele”.
O cristianismo deles era mais do que meras palavras. Um cristão primitivo disse: “Nós não falamos sobre grandes coisas; nós as vivemos!” Umas das marcas dos cristãos primitivos, que eram pessoas simples, que trabalhavam duro e tinham uma educação rudimentar, era a obediência literal, quase infantil, aos ensinos de Jesus e dos apóstolos. Eles não achavam que tinham que primeiro entender um mandamento para depois obedecer-lhe. Simplesmente confiavam que os caminhos de Deus eram sempre melhores.
Por isso, Clemente perguntou: “Quem poderia ser tão audacioso a ponto de não crer em Deus e exigir que Ele desse explicações a meros seres humanos?”
Eles confiavam em Deus porque respeitavam a Sua soberania e sabedoria. O maior exemplo de sua total confiança em Deus era a aceitação que tinham da perseguição que sofriam.
Desde a época do imperador Trajano (por volta do ano 110 d.C.) até o Édito de Milão (313 d.C.), a prática do Cristianismo era proibida dentro do território romano. Ser cristão era crime punido com a morte. Mas os oficiais romanos geralmente não caçavam cristãos. Eles os ignoravam, a menos que alguém fizesse uma denúncia formal. Por isso, a perseguição era intermitente. Enquanto os cristãos de uma determinada cidade sofriam torturas e morte, cristãos de outra cidade vizinha permaneciam intocados. Era tudo muito imprevisível. No entanto, todos os cristãos viviam com uma sentença de morte pesando em seus ombros.
A própria notícia de que os cristãos estavam dispostos a sofrer horrores e até a morrer por seu Senhor era, junto com seu estilo de vida, sua maior ferramenta evangelística. Poucos romanos, provavelmente nenhum, morreriam por seus deuses. Na verdade, a palavra grega para “testemunha” é mártir. Em várias passagens bíblicas em que lemos “testemunhas”, os cristãos primitivos liam “mártir”. Por exemplo, Apocalipse 2:13 refere-se a “Antipas, minha testemunha, meu fiel, o qual foi morto entre vós”. Mas os cristãos primitivos entendiam a passagem como: “Antipas, meu mártir, meu fiel”.
Embora a maioria dos cristãos tentasse fugir da perseguição sempre que possível, recusavam-se a sair do Império Romano em um êxodo em massa. Eles acreditavam, com a simplicidade de uma criança, que Deus edificaria sua Igreja sobre uma pedra e que o Inferno não prevaleceria contra ela. (Mateus 16:18)
O Cristianismo primitivo se espalhou pelo mundo antigo como fogo em palha. Era um movimento de contracultura que desafiava as principais instituições da sociedade romana. Tertuliano, líder da Igreja de Cartago, África do Norte, escreveu a respeito disso: “Nosso desafio é contra as instituições dos nossos ancestrais, contra a autoridade das tradições, contra as leis humanas, contra a sabedoria do mundo, contra a antiguidade, contra os costumes”. (Tertuliano – Aos Pagãos – Livro 2, capítulo 1)
Assim, é de se estranhar que a igreja moderna afirme que os cristãos que viveram nos primeiros séculos estavam simplesmente ensinando e praticando a cultura de sua época. Chega a ser irônico, já que as maiores críticas que eles recebiam dos romanos eram por justamente não seguirem as normas culturais daqueles tempos.
Contudo, a relação que os cristãos primitivos tinham com a cultura da época não era simplesmente uma questão de histórias do passado. É algo que interessa à igreja atual, já que a maioria dos problemas que a igreja do século XXI enfrenta é bem parecida com os problemas que a igreja primitiva enfrentava. Mas, geralmente, a maneira com que lidamos com estas questões é bem diferente do modo como eles lidavam com elas.
Vejamos alguns exemplos:
Divórcio – a praga romana
Como a maioria das sociedades, a família era o centro da civilização romana. Mas, assim como nos nossos dias, os casamentos eram, muitas vezes, infelizes. Tanto o marido quanto a esposa geralmente tinham amantes. Nos tempos de Cristo, os casos extraconjugais por parte de ambos os cônjuges eram tão comuns que já não causavam escândalo.
Homens e mulheres romanos frequentemente se casavam quatro ou cinco vezes. Tertuliano observou que: “As mulheres anseiam pelo divórcio como se fosse uma consequência natural do casamento”. Na sociedade romana, grande parte dos casamentos era arranjada pelos pais dos noivos. Assim, os casais não ficavam apaixonados um pelo outro. Com frequência, a diferença de idade era muito grande. Isso acontecia tanto com os cristãos quanto com os romanos. Então, era muito mais fácil justificar o divórcio naquela época que nos dias de hoje.
Apesar de o divórcio ser muito bem aceito na sociedade em que viviam os cristãos, para eles, só era permitido se houvesse adultério. Os cristãos levavam muito a sério as palavras de Jesus: “…o homem que mandar sua esposa embora, a não ser em caso de adultério, se tornará adúltero se casar com outra mulher”. (Mateus 19:9 NTLH). A posição tão severa que os cristãos tinham em relação ao divórcio, obviamente, não era um reflexo da sua cultura.
Mas o que dizer da nossa atitude frente ao divórcio? Será que nossa opinião não tem seguido as tendências da nossa cultura?
Há cinquenta anos, um cristão jamais poderia se divorciar de seu cônjuge por simples “incompatibilidade de gênios”. Mas nos dias de hoje, o divórcio tem crescido tanto entre o povo evangélico que já está se aproximando do índice de divórcio do mundo. O que mudou? Com certeza, não foi a Bíblia. Ao contrário, o grupo conservador da sociedade americana é que mudou seu ponto de vista sobre o divórcio.
Os evangélicos, geralmente, se orgulham de se opor às atitudes e tendências “mundanas”. Mas, na realidade, geralmente nos opomos somente ao segmento liberal do mundo. Assim que um costume é aceito pela sociedade conservadora, logo, a igreja também passa a aceitá-lo. O divórcio é um bom exemplo disso.
Alta moda e baixo pudor
O Apóstolo Paulo instruiu as mulheres: “Quero também que as mulheres sejam sensatas e usem roupas decentes e simples”. (1 Timóteo 2:9 NTLH). Uma mulher romana elegante usava quase todos os apetrechos de beleza que existem em nossa época. Ela começava o dia arrumando o cabelo e fazendo maquiagem. Pintava os lábios, passava sombra negra nas pálpebras e aplicava cílios postiços. Depois, passava pó no rosto e ruge nas bochechas. Ela usava os cabelos em um penteado elaborado com franja e várias camadas de cachos, formando uma cascata parecida com um véu de noiva. Algumas mulheres importavam perucas da Índia e muitas tingiam os cabelos de loiro.
Um romano escreveu a uma amiga: “Enquanto você fica em casa, seus cabelos ficam no cabeleireiro; você tira seus dentes para dormir e dorme entre inúmeras caixas de cosméticos. Até seu rosto não dorme com você! Então, você pisca para os homens nas ruas sob sobrancelhas que tirou de uma gaveta pela manhã”.
Clemente comentou a vestimenta das mulheres romanas da época: “Essas roupas, quando grudam no corpo, tomam sua forma, aderindo à carne. Elas acentuam as formas femininas de maneira que todo o corpo fica à mostra, mesmo que não se possa vê-lo… Esse tipo de roupa é feito para ser admirado e não para cobrir o corpo”.
Entretenimento romano – proibido para menores
Os romanos da alta sociedade gostavam muito de gastar tempo em lazer. Preenchiam suas noites com banquetes de glutonaria, teatro e esportes na arena. Os cristãos, contudo, não gostavam de participar dessas festas. O teatro romano foi inspirado nos gregos e seus temas preferidos eram o crime, o adultério e a imoralidade.
Tertuliano questiona o “lazer” praticado pela sociedade romana: “Como pode ser certo ver coisas que são erradas de se fazer? Como uma coisa que contamina o homem quando sai de sua boca não o contaminará quando entra através de seus olhos e ouvidos?”
Hoje em dia, os filmes de alta produção e mais vendidos estão repletos de cenas de violência, crimes e imoralidades, além de cenas de sexo e perversão. Será que estamos dispostos a tomar uma posição tão inflexível em relação aos entretenimentos modernos que corrompem as noss
as convicções cristãs?
A realidade é que a igreja do século XXI está casada com o mundo. As atitudes, o estilo de vida, e os problemas do mundo logo se tornam as atitudes, o estilo de vida e os problemas da igreja. Russ Taff, um cantor cristão popular, fez a seguinte observação sobre a igreja evangélica atual: “Cristãos frequentam consultórios psicológicos, cristãos têm problemas familiares e cristãos se tornam alcoólatras. A única diferença entre cristãos e não-cristãos é a fé em nosso Deus Criador, que nos ama e nos ajuda diariamente”.
Creio que a análise de Russ Taff seja sincera. No entanto, acredito que é muito triste pensar que isso é tudo o que cristãos professos de hoje podem dizer com sinceridade.
Originalmente, os cristãos eram muito diferentes da sociedade onde viviam, e seu principal testemunho era seu estilo de vida. É claro que nem todos os cristãos viviam uma vida plenamente santificada, mas sem dúvida, era o estilo de vida que os cristãos primitivos viviam.
Então, por que será que eles eram capazes de viver de maneira diferente de sua cultura, enquanto nós achamos tão difícil viver assim? Que poder é esse que eles tinham e que nós não temos?
Isso é o que veremos nas próximas semanas.
Que Deus os abençoe!